Preguiça: Depressão? (conto by Lela Rago)





— Ai de mim, sou tão doente, como posso fazer tudo sozinha?

— Mamãe, — meu filho choraminga — eu posso limpar a casa e colocar a roupa na máquina, mas cozinhar é difícil.

— Você não me ama, porque não sou uma boa mãe, como não ter depressão?

— Pode deixar, vou tentar arrumar comida, mamãe!

— Ótimo! — ajeito-me no sofá quando ele sai.

Está chegando o dia da visita da assistente social, preciso ficar mais atenta, da última vez quase caí em contradição. É cansativo o que tenho que fazer para não fazer nada, começo a rir.

Preciso arrumar mais filhos, Malcom não vai dar conta de tudo sozinho, um fraco como o pai dele.

O menino volta da rua com uma sacola com várias marmitas dentro, ele pode ser fraco, porém sua sorte é admirável.

— Olha quanta comida consegui, mamãe!

— É razoável! — avalio, ele não pode ficar convencido.

Ouço palmas no portão e Malcom vai atender.

— Entra, ela está na sala. Mamãe, é a dona Santina.

Que porra esta assistente social está fazendo aqui logo hoje? Eles estão vindo com mais frequência e isso não é bom.

— Que coincidência, Santina, estava pensando em você. — não é uma mentira, certo, penso com sarcasmo.

— Como tem passado, Lígia? — a mulher questiona séria — Tem tomado seus remédios? Já encontrou um emprego?

— Sente-se querida, Malcom pega um chá para nossa visita. — ignoro as perguntas dela de propósito.

— Não estou de visita e sim a trabalho. Malcom, sente-se ao meu lado. Lígia, recebemos uma denuncia que está obrigando seu filho a trabalhar.

— Que bobagens, deve ser aquela vizinha da esquina, a cretina adora falar pelas minhas costas.

— Não vem ao caso quem foi, na verdade, estamos de olho em você há meses e hoje chegou o ponto final.

— Não entendo? — que porra ela está querendo dizer.

— Malcom virá comigo, há uma família que quer adotá-lo.

— Não, ele é meu filho! — grito e faço uma cena.

Se ele for embora, quem vai fazer as coisas em casa e providenciar comida até que eu arrume mais filhos? Que merda, preciso ir para as ruas para engravidar o mais rápido possível.

— Dona Santina, olha o que fez com minha mamãe! — Malcom chora e corre até mim.

— Querido, você precisa frequentar escola, fazer amigos e brincar com eles. Não é obrigação de uma criança cuidar de sua mãe, na verdade ela tem que trabalhar e ganhar o sustento para ambos.

— Mas ela é dodoi! — Malcom choraminga.

— A doença dela estaria sob controle se seguisse as orientações médicas.

Não perco o sarcasmo na voz da puta, tenho que me fingir de coitada para convencer o menino a ficar comigo, assim afirmo com tristeza:

— Filhinho, ela quer tirar você de mim porque sou pobre.

— Não, — ele grita — quero ficar com minha mãe!

— Nunca separei famílias por causa da pobreza, meu trabalho é fazer com que as leis sejam cumpridas e impedir o modo como trata seu filho está dentro de minhas funções.

Que porra! Quero gritar de ódio, mas acho melhor continuar com meu sorriso triste nos lábios.

— Então vai levar o amor da minha vida de mim? — resolvo substituir o sorriso por um choro que até para mim soa falso.

— Calma mamãe, não vou a lugar nenhum! — Malcom neste momento está agarrado ao meu pescoço soluçando de tanto chorar.

Neste instante, um casal estranho entra em casa e a fulana diz se abaixando na altura de Malcom e acariciando seus cabelos:

— Oi, querido, não chora não. Conta uma coisa para mim, você gosta de cachorro?

— Eu gosto, mas a mamãe falou que não posso ter um porque um cachorro deixaria ela mais doente. — Malcom fala limpando suas lágrimas, visivelmente curioso com o assunto sobre o maldito cachorro.

— O que acha de vir comigo para brincar com o Odin?

— Quem é Odin?

— É nosso cachorro. — o homem se abaixa como a mulher — Se vier conosco, vai poder correr com ele lá na praça.

— Sério? — Malcom questiona com os olhos brilhando de excitação ao mesmo tempo que seu rosto está contraído pelo receio de me deixar — Mas minha mamãe é dodói e não pode sair de casa.

— Então você vem com a gente e quanto ela ficar saudável pode vir também. — a maldita mulher fala com sarcasmo.

Malcom olha para mim e para o casal sem saber o que fazer, neste instante percebo que estou perdendo terreno e num momento de insanidade acabo gritando e avançando para ele com meu chinelo na mão:

— Malcom, não se atreva a ir com estas pessoas!

A mulher o pega no colo e vira de costas para protegê-lo é quando percebo a besteira que acabei de fazer, alheio ao que realmente está acontecendo o menino garante:

— Não fica brava, mamãe, vou brincar só um pouquinho com Odin, depois volto para arrumar meu quarto.

O casal sai ele porta a fora fazendo planos para o futuro para distraí-lo, mesmo assim o menino olha para trás com a cara triste e questiona:

— E quem vai cuidar da minha mamãe até eu voltar?

— Malcom, — a puta da Santina se intromete — não se preocupe, tem dois amigos meus lá fora que vão garantir para que sua mãe não fique sozinha.

Assim que Malcom sai com o casal e a puta Santina, dois policiais armados invadem a casa e me algemam. Bom, pelo menos na cadeia não precisarei fazer nada, penso com um sorriso satisfeito.



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