Era uma vez… não, muito romântico…
Há muitos anos atrás… não, muito piegas…
Houve um tempo em que… não, muito velho…
Agora é oficial, não sei contar uma história, como alguém consegue escrever algo sem parecer um maldito conto de fadas? Sem contar que há tantas regras e leis que a coisa torna-se impossível de pôr em prática.
O coitado do escritor tem que tomar cuidado de não plagiar a história de outro, não pode errar na gramática e na escrita, tem respeitar o roteiro com início, meio e fim.
Carai, desculpe escrevi errado a forma culta é caralho, o problema é que quero começar com “... e viveram felizes para sempre” para depois contar toda merda que passaram para chegar lá, “Ah, mas assim não tem graça, todos vão saber que eles ficam bem no final” ou “ele vai morrer então para que ler a narrativa toda de 700 páginas” e eu com isso? Quantas pessoas lêem o fim da história por não aguentar tanta lenga lenga que o autor está contando?
Eu, uma simples desconhecida, em vários livros chatos, leio uma página e pulo dez, o complicado neste sistema é quando você perde uma parte importante e tem que fazer seu caminho de volta, mas acontece, fazer o que?
Outra coisa que o escritor tem que se preocupar é com a quantidade de palavras de um texto, puta merda, quer dizer que ao invés de uma corrida dos cem metros ele passa, sem treino, para os cem metros com barreiras… seria melhor com revezamento, pelo menos teria outro trouxa para ajudá-lo.
Socorro, só quero contar que outro dia estava andando na rua e cai, foi um vexame completo, sim, porque você nunca cai sozinho na rua, sempre tem uma platéia digna de final de campeonato de futebol entre Corinthians e Palmeiras, ou final de copa do mundo entre Brasil e Alemanha… no caso você é o Brasil, claro, kkkk… acho que peguei pesado, desculpem torcedores.
Voltando a minha queda, o pior não é metade da cidade presenciar sua trapalhada, mas um cidadão vir perguntar se está tudo bem com aquela cara de “quero rir e não posso”, essa cara é de matar, aliás melhor seria morrer a ter que enfrentá-la, porque você levanta, sozinho, com sua cara mais vermelha que um pimentão, o joelho todo ralado e a dignidade rasgada e diz “estou bem obrigado” com aquele sorriso amarelo, louco de vontade de soltar um “vai tomar no olho do seu cu, filho da puta”, “vai rir da mãe, seu corno”, ou seja, soltar todos os palavrões que conhece mais alguns em inglês, só para garantir, como se o cidadão fosse o responsável por sua total incapacidade de andar. Toda esta honestidade não iria ajudar na sua humilhação, porém seria engraçado ver a surpresa na cara do cidadão…
Você já passou por isso? Eu sendo eu, passei por várias e diversas vezes, nem sei por que ainda fico envergonhada, devia levantar e responder “estaria bem se não tivesse caído como uma jaca podre, imbecil” ou “aí, nenhum filho de uma puta vai me ajudar a levantar, não?” ou “se estou bem? Faz um teste e cai também, assim terá sua resposta”. Esta última seria a melhor, imagina o cara se jogando do chão e você devolvendo o olhar para ele com a cara de “quero rir e não posso”, seria uma realização pessoal.
Estou preocupada, será que consegui atingir os cem metros? Falei tanta coisa e esqueci o principal, claro que quando se conta uma história muito cheia de voltas corre-se este risco.
Então quando cai derrubei um quadro que fui buscar e, lógico, cai em cima dele, além de quebrar o infeliz, ainda entrou uma farpa em meu dedo indicador. Quer dizer, gastei com o quadro, passei vergonha e ganhei um tronco enfiado no dedo, não devia ter levantado da cama.
O problema da farpa é tirá-la, porque você sente a infeliz, mas não a vê, aí tem que ficar cutucando com uma pinça para tentar adivinhar onde ela está, deixando seu dedo tão lindo quanto seu joelho ralado.
Joelho, falei que várias pedrinhas ficaram presas nele? Um dos problemas de cair na rua é que ela não é lisa, se fosse só a dignidade ficaria danificada, contudo “desgraça pouca é bobagem”, esta afirmação era da minha avó… saudades dela, mulher sábia. Gostaria de ser capaz de descobrir quem inventou esta lei, que o azar tem que vir em pares ou vários ímpares.
Setecentas e quarenta e cinco palavras até agora, olha que maravilha, o problema é que acabei a história e minha meta eram mil e duzentas palavras, ah entendi, chegaram as barreiras. Tive uma ideia e se eu aumentar o tamanho da fonte? O texto cresce sem eu ter que pensar mais. Garanto que um engraçadinho desocupado terá a capacidade de contar letras e espaços para confirmar se eu trapaceei ou não. Está vendo, é muita injustiça com o pobrezinho do escritor.
Agora é sério, vou parar de “encher linguiça”, by vovó novamente, e continuar com minha história.
Quando cheguei em casa, foi a vergonha parte dois, a revanche, todos, eu disse TODOS, os INGRATOS que moram comigo não fizeram a cara de “quero rir e não posso”, todos riram mesmo.
Comecei fazendo aquele drama, que estava toda machucada e humilhada, e contei com mais de mil e duzentas palavras toda minha miserável queda, quando terminei foi uma gargalhada geral, minha própria família, que decepção. Como sempre digo, para que serve a família se não for para piorar sua vida.
Já viu quando você leva o namorado pela primeira vez em casa? Lá vem a mãe trazendo aquelas fotos suas que seu maior desejo é queimá-las e mostra ao cara. Sou gorda e baixa, sempre fui gorda e baixa, e minha infância vivi nos anos setenta, imagina a tristeza das fotos, tenho uma que estou em um vestido longo, pareço uma porpeta, sabe sem frente nem traseira, uma coisa só, quando o cara vê aquela em específica e fala “que lindinha”... lindinha é o caralho (viu aprendi escrever), o que dá para pensar, que ele só pode estar tirando uma onda com você. É fim de namoro, noivado ou casamento, mas se você terminar com ele vai virar solteirona, melhor ficar sozinha do que com um puto que acha sua pior foto lindinha.
Bem voltando a minha família, fiquei firme no meu drama e comecei a chorar, alegando que eram insensíveis por rir da minha desgraça, verdadeira cena de novela mexicana, nesse meio tempo, acredito que bateu arrependimento neles e pararam de rir, então me fartei em autopiedade… kkkk, em consequência ganhei jantar especial com minha comida preferida e fiquei livre de arrumar cozinha, devia ter exigido uma massagem nos pés, teria sido muito gostoso, mas enfim melhor não abusar.
Mil cento e trinta e seis palavras, gente, como um escritor consegue escrever 700 páginas, já imaginou quantas palavras há em cada página, minha autora preferida, Lela Rago, escreveu sua primeira obra com 46.581 palavras divididas em 263 páginas, loucura… como sei? Sou ela, amigo… kkkk.
Brincadeiras à parte, este texto foi apenas para ilustrar a dificuldade que os autores passam para escrever seus livros, que no geral são publicações independentes, pois poucas editoras perdem tempo com novatos.
Quero agradecer aos que seguem minha jornada, espero que não desistam de mim, pois pretendo continuar por um tempo com vocês, quem sabe até alguém falar com todas as mil e duzentas palavras “que não sei contar uma história”.
Beijocas